Sou da companhia da Bugra

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

ANI - Animal Não Identificado / Vanda Ferreira

ANI
Vanda Ferreira




Especialmente hoje pausei meu acelerado cérebro desenfreado e louco, para pensar em meu futuro.
Para pensar exatamente no tempo do futuro bem longínquo, quando esta carne que me configura estiver morta e devorada pela fome dos vermes viventes há sete palmos de profundidade na terra abaixo.




Acredito que algo será falado a respeito de uma mulher


que era o celeiro de uma alma ermitã;


Que escrevia feito bicho estranho,
ANI (Animal Não Identificado) ...


Que vivia atribulada com sua realidade carregada de afazeres e que em fugidios minutos escrevia; escrevia, escrevia.


Seus lábios carnudos eram copia da boca das índias do mato.


O cabelo claro e encaracolado denunciava a mistura, o testemunho da cruza de negrura e brancura.




Era uma vez uma mulher.
Ela tinha beleza física de européia e nobre coração de bugre.


Seu sangue era verde, e seivava pelos poros de pele floral.
Ela nasceu no mato, amava o mato e vivia no mato.


Escreveu sobre o mato.
Cantou sobre o mato e morreu feliz no mato.




Mas viveu um pesadelo.


Seus textos eram pouco lidos. Ninguém se interessava em ler poesia matuta. Ninguém queria rimar céu azul, com Mato Grosso do Sul e nhambu e teiú, muito menos urubu e seu fundamental papel no mato.


Rimas de mato com tato, fato, trato, contato com mato, não eram valiosas. Ninguém via a explícita poesia do mato.


Ninguém queria que falasse, ou abordasse as brancuras dos papéis imaculados, para sobre a incontrolável atração de homens brancos pela magnitude de mulheres índias e negras.


Ninguém publicou seus textos sobre os acasalamentos de brancos invasores da terra brasileira, cuja tara engravidava as índias e estas davam à luz à nação brasileiríssima: Bugres e Bugras.




Ninguém assumia que se apossou das terras de seus verdadeiros donos. Ninguém assumia que usava papel higiênico e cimento e tijolo do útero da mãe-natureza. E que bebe da preciosidade que verte de uma ferida aberta no coração da mãe-natureza.




Mas ela não escrevia para ninguém!


Ela exteriorizava seu amor para o papel porque o mato é extenso, alto e profundo e não havia como abraçar e beijar o mato e então transbordando de amor pelo mato produziu enes pergaminhos e os distribui em um belo corredor na galeria do barranco do rio no mato.


Para quando o futuro chegar e os historiadores e pesquisadores resolverem caminhar pelo deserto que era o mato na avenida sinuosa esculpida pela maestria da preciosidade que verteu da ferida aberta no coração da mãe-terra.




Falando em Mato, importa tudo da vida




E NADA IMPORTA O CALIBRE DO MATO.
NÃO IMPORTA SE É GROSSO OU FINO, RÍGIDO, RETO, TORTO, DELGADO.
IMPORTA QUE Seja MATO.




Ai, ai que me engulam porque quando eu morrer renascerei mesmo!!!


Assim como Fênix, e tenho pressa em investir na imortalidade da CULTURA RURAL e a bestialidade humana passará, ninguém viverá sem a fauna e flora e água e terra e comida natural e sol e lua...


Tudo é primeiro plano e nós humanos mortais estamos em um plano tão fim de fila que sairemos urrando, gritando, clamando por água, canto de passarinho, alface, árvore e leite que vem da vaquinha que come grama que nasce nos grandes campos que se chamam pasto!!!!

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